Sorry to Bother You(2018)
de Boots Riley, com Lakeith Stanfield, Tessa Thompson, Jermaine Fowler, Omari Hardwick e Terry Crews
Parte do cinema corrente está um pouco acomodado. Fórmulas de
sucesso são repetidas, personagens são emuladas e várias franquias estão a ser
renovadas. Mas temos tido surpresas agradáveis ao longo deste ano, exemplo
disso são os cineastas Ari Aster (Hereditary)
e Bo Burnham (Eighth Grade) que
espevitaram a 7º arte com engenho e ambição. Mas por muito louvável que seja
ter ambição, tê-la em excesso pode ser comprometedor. É neste
domínio que entra Sorry to Bother You, realizado e
escrito pelo estreante Boots Riley.
Estamos num futuro próximo em Oakland, América, e
as pessoas lutam para puder pagar a renda à mercê de grandes empresas.
Cassius Green (Lakeith Stanfield) é uma dessas pessoas. Desempregado e a
viver com a namorada (Tessa Thompson) na garagem do seu tio, a sorte
surge em forma de contrato de trabalho para uma empresa de telemarketing
chamada RegalView. Inicialmente é um desastre, mas quando aceita o
conselho de um colega e começa a usar uma "voz de branco", as suas
vendas disparam. O que estará Cassius disposto a perder para chegar ao topo da
cadeia corporativa?
Esta é uma introdução minimalista a uma
sátira explosiva em conceitos e comentários sociais. Desde o
capitalismo ao próprio telemarketing, passando pelo racismo sistémico e
pela relação trabalho-família, o filme funde os tópicos e oferece uma
comédia tão desorganizada quanto ousada. A primeira metade pode até recordar o
filme Office Space (1999), mas ainda assim consegue trespassar uma
experiência de natureza surrealista.
Ao tentar tocar em situações reais do dia-a-dia, as
propriedades ridículas da narrativa afastam a seriedade das matérias, o
que faz com que a sátira perca força e foco. O desenrolar da história
só vem perpetuar este problema, nomeadamente quando o elemento de ficção
científica surge, trazendo com ele mais estragos do que correções.
É pena porque no campo das interpretações não há muito a
apontar. Stanfield encarna o protagonista com um sentido de insegurança e
melancolia que condizem com o tom que o filme pretende atingir. E o outro
destaque vai para Armie Hammer que interpreta o CEO de uma grande empresa de
forma desprezível e carismática ao mesmo tempo (podia ter tido mais
preponderância, o filme precisava dele). O restante elenco secundário é
prestável, mesmo quando os seus subenredos acabam por não dar em nada.
Sorry to Bother You sofre de uma espécie de síndrome que aflige parte dos
realizadores que expõe os seus primeiros filmes: querer expressar todas as suas
ideias numa história só. Não há dúvidas da paixão de Boots Riley pelo
projeto e é bom que cada vez mais cineastas estejam dispostos a arriscar,
contudo, parte do humor não cai bem e a narrativa não tem alicerces para suster
tantas ideias. Como muitos que tentam o mesmo fim, acabou por desabar.
